22 de setembro de 2017

Parte 2 de 2: Isaurinha e Seu Fernando.


amor na terceira idade, pureza na terceira idade

Aí está a segunda parte de "Isaurinha e Seu Fernando", que compõe, juntamente com outros quinze, o livro Quilômetro Cinza e Outros Contos de Cabeça! Os contos foram publicados na Amazon. Você pode comprar o eBook ($4,50), clicando AQUI, ou o livro impresso (USD15,50), que você compra acessando AQUI. 
Espero que gostem do desfecho! 

Isaurinha e Seu Fernando



Tratavam-na como um animal de estimação. Nos primeiros dois dias, Seu Fernando arrumou um vaso de flores vazio para que Isaurinha forrasse o fundo com algumas folhas e gravetos, fazendo o vaso de casa para a aranha. Zelosa, colocou até mesmo uma tampinha que enchia de água, caso a mesma sentisse sede, e insetos, caso tivesse fome e preguiça de caçá-los.

Isaurinha a mimava. Conforme os dias passaram, as horas transcorreram, a aranha revelou-se então única no que foi se desenvolvendo e crescendo muito acima do imaginável. Já não vivia mais no vaso, circulava por todos os cômodos do sobrado. A criatura, para a graça de todos que a viam fazendo companhia ao casal, ganhara o tamanho de um cachorro da altura dos joelhos de Isaurinha. Isaurinha batizara a mutante com o nome Vitória. Achava propício esse nome.

“Quer dar uma voltinha pelo bairro, Vitória?”

“Não deve ser isso, minha vida. Não. Não. Já sei o que é! Vitória está com fome. Vou lá fora caçar mais insetos e já volto.” - Seu Fernando voltava sempre com um pote cheio de mariposas e borboletas que capturava ora na praça, ora em uma mata próxima do sobrado.

Assim era a rotina da aranha: depois de alimentada, levavam-na para passear e a apresentavam com todo orgulho para os amigos, vizinhos e desconhecidos que não se mostravam menos carinhosos ao vê-la.

“Chama-se Vitória.” - diziam, o casal. - “Ela é muito querida. Cresceu tanto pelo amor.”

Foi então que certo dia, quando a vida corria normalmente, a rotina fluindo, o céu ficou coberto da cor cinza e uma chuva forte lavou a cidade durante aquela tarde, a noite e boa parte do dia que se seguiu. Não havia ninguém que não tivesse a vida sido afetada pelo temporal ou que não conhecesse alguma pessoa prejudicada. Assim que a chuva começou, um cão rotweiler que fugia do aguaceiro se abrigou na varanda do sobrado e pôs-se a latir com medo dos sucessivos trovões, como que implorando por abrigo. Isaurinha e Seu Fernando, ao ouvir os latidos, solidários, abriram a porta rapidamente para que ele entrasse e se abrigasse da chuva. Adotaram o cão rotweiler.

Seu Fernando o batizou com o nome Gilbert.

Gilbert e a aranha Vitória se tornaram tão amigos e leais um para com o outro que não se desgrudaram um segundo desde então.

Mais um sábado, Isaurinha e Seu Fernando arrumavam as últimas bonecas dentro de duas malas para vendê-las na feirinha de artesanato da praça.

“Gilbert e Vitória, vocês querem ir com a gente?” - Seu Fernando perguntou aos dois que já os esperavam, ansiosos, na porta do sobrado.

“Claro que querem, papai.” - Isaurinha respondeu por eles. Brincou. - “A gente quer muito, não é mesmo crianças?”

Não queriam deixá-los em casa, desprotegidos e sem companhia.

Gilbert e Vitória foram juntos com o casal. Logo que chegaram na praça, enquanto Isaurinha e Seu Fernando ajeitavam as bonecas de porcelana que venderiam, o cão e a aranha mutante se juntaram aos pés de uma árvore, quietinhos para que assim não distraíssem os clientes ou atrapalhassem as vendas. E por mais que a lógica dissesse o contrário, não atrapalharam as vendas. Gilbert e Vitória funcionaram como atrativos para que a meninada se aproximasse e se interessasse ainda mais pelas bonecas.

Venderam mais do que na semana anterior. Tão prontamente a meninada se aproximava, Isaurinha era carinhosa com todas e também com aquelas que já se apresentavam dizendo só estarem admirando as bonecas. Seria assim na semana que se seguiu, e na seguinte, com Gilbert e Vitória aos pés da árvore, enquanto vendiam todas as bonecas que haviam levado à feira.

Em uma dessas vezes que atenderam a meninada, uma em especial, de vestido azul, se aproximou então da bondosa Isaurinha e do generoso Seu Fernando.

“A senhora se lembra de mim?” - perguntou.

Isaurinha, mesmo com uma ligeira suspeita de conhecê-la, não se lembrou.

A menina respondeu a própria pergunta:

“A senhora me deu uma boneca de presente quando eu estava junto com o meu vovô. Se lembra de mim agora?”

“Sim, agora me lembro. Mas onde está o seu vovô? Está sozinha?”

“Meu vovô morreu, mas não estou sozinha porque ganhei uma mamãe.”

Seu Fernando, no que a ouviu dizer que ganhara uma mãe, comemorou:

“Que bom saber disso!”

“Sim, ganhei uma mamãe de coração. É assim que eu chamo ela. E ela também é muito rica.” - disse, a menina de vestido azul.

A menina, de forma resumida, contou o que se sucedeu em sua vida nos últimos dois meses. Disse que seu avô havia morrido e que fora levada a um orfanato, onde, poucos dias depois, conseguiu ser adotada.

“Eu quero dar um presente para a senhora.” - ofereceu uma bonequinha de ouro cravejada de diamantes e outras pedras preciosas. - “Por favor, diz que aceita!”

“É muito valiosa, eu não posso aceitar.” - Isaurinha recusou.

“Insisto que aceite.” - emendou, a menina. - “A senhora foi muito boa comigo. Foi mamãe quem sugeriu que eu lhe desse esse presente. A senhora merece e precisa dele.”

Assim sendo, ao lado de Seu Fernando, Isaurinha aceitou o presente. A menina sabia que a joia era uma inequívoca ajuda financeira ao casal. Ao deixar a praça, despediu-se ainda de Vitória e do cão rotweiler Gilbert. Ambos a observavam com ternura.

Todos os personagens, às suas estranhezas, guardavam preciosas semelhanças e, por isso mesmo, eram especialmente singulares.

FIM

Um comentário:

  1. Comecei pela segunda parte (rsrs), mesmo assim não fiquei perdida no conto, você escreve muito bem e fiquei envolvida com o conto. Parabéns pela escrita.

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